Certa vez, ouvindo religiosamente uma palestra pelo inspirador pediatra espanhol Carlos Gonzalez, ouvi aquela que foi a frase que resume, em absoluto, a minha opinião sobre se os bebés ou as crianças devem dormir na cama dos pais.
E a frase é esta: los niños se van todos.
Sim, eu sei que é difícil imaginar que o vosso bebé, agora redondinho e dependente, tornar-se-á um dia num adulto confiante e autónomo, desejoso de concretizar as suas próprias escolhas, que passarão, obviamente, por deixar de dormir com a mãe.
Sim, eu sei que é difícil pensar que aquela mão sapuda que cabe inteira na vossa, vai um dia ser maior, mais calejada e mais capaz.
Sim, os nossos filhos vão crescer e, tal qual os três porquinhos da história infantil, vão construir as suas casinhas e sair debaixo da nossa asa.
Sim, os nossos filhos vão partir. Todos. Sem exceção. Rumo às suas próprias vidas, no seu próprio tempo.
E por isso, pergunto-me: até que ponto é lícito, como pediatra, aconselhar tirar os filhos do sítio onde eles gostam de dormir, com quem eles querem dormir, advogando um hipotético benefício de saúde?
E será que esse benefício realmente existe? E se existe, qual é?
Se eu separo uma criança da cama dos pais, eu estarei precisamente a ensinar-lhe o quê?
A autonomia do sono? Que é melhor dormir sozinho? Sim, hipoteticamente, se queremos que o sono seja mais reparador. A verdade é que dormir sozinho, traz menos interferências, menos despertares. Não acordamos quando a outra pessoa se mexe, ou ressona, ou fala durante o sono. Por outro lado, como espécie, a nossa sobrevivência assentou na capacidade de vigiarmos o sono uns dos outros. Somos mamíferos, somos diurnos, pelo que tivemos que desenvolver um mecanismo de proteção do nosso sono. Tendo que dormir sensivelmente um terço da nossa existência, já percebemos que o sono não é um assunto menor! Naturalmente, que dormir em grupo, seria uma forma de garantir que ficaria sempre alguém de vigia.
Mas claro, a vida atual não nos coloca em risco de sermos atacados por um tigre com dentes de sabre na nossa caverna. Agora temos toda a segurança e todo o conforto, para podermos prescindir de dormir com alguém. Mas ainda assim, se é tão vantajoso dormir sozinho, porque é que os adultos andam à procura da sua cara metade para dormir com ela? E não é dormir com alguém uma prova de enorme intimidade e entrega? E de quem queremos que os nossos filhos, enquanto pequeninos, sejam íntimos?
Então, tudo se resume a isto: porque é que queremos que as nossas crianças durmam sozinhas, quando nós, enquanto adultos, não o fazemos?