7/1/2021

O que aprendi durante o confinamento?

Gostava ser daquelas pessoas ultra positivas que dizem que perder é praticamente impossível: ou se ganha ou se aprende. Mas não sou. Sei bem que é mais fácil ser positiva, politicamente neutra e com opiniões mais ou menos consensuais. Parece ser justamente isso que as pessoas esperam de nós. Mas a verdade é que eu perco. E bem. Não no sentido de bem-perder, fair play, blá, blá, blá, mas perder em grande, por 100 e por 1000.

E, depois deste período de confinamento, senti que perdi muitas coisas: profissionalmente, perdi sobretudo o descanso e a paciência. A escala de trabalho foi sobretudo difícil durante o mês de Abril. Senti que nunca mais acabava. Maio foi um pouco mais fácil, mas temo sempre que, com o desconfinamento e o esperado aumento do número de casos, as circunstâncias venham a mudar.  À parte da horas de trabalho, nunca trabalhar foi tão aborrecido, burocrático e complicado como agora. Entre equipamentos de protecção, regras e contra-regras, perdemos todos uma parte considerável da nossa energia com assuntos que, do ponto de vista estrito, são muito pouco clínicos. É sobretudo muito cansativo.

Do ponto de vista pessoal, este confinamento aumentou a sensação de exigência familiar. Ter dois miúdos pequenos em casa equivale a ter que manter um circo em funcionamento. Os números de entretenimento sucedem-se e tenho sempre a sensação que o público - os dois putos - querem sempre mais e mais. Se pintamos querem saltar no trampolim, se saltam no trampolim, querem construir uma cabana, se constroem a cabana, querem ir pintar. E assim sucessivamente, numa roda viva de actividades. E para quem sobra toda a arrumação? Pois claro. Adivinharam. E claro que é muito fácil dizer que "devias ensina-los a arrumar as coisas deles", claro que sim! Isso eu até sei, mas deles arrumarem de forma errática cerca de 5 peças de legos quando espalharam 50 é um pouco exasperante. Ou podem dizer "devias deixa-los em paz, eles que se entretenham e que se aborreçam. O aborrecimento faz bem às crianças." Pois. Quem diz isso acredita piamente que crianças aborrecidas são silenciosas...e com poucas horas de sono à mistura, o que eu gostaria mesmo era de um pouco de silêncio.

Mas à parte das coisas que perdi, senti que o confinamento me ensinou coisas preciosas: ensinou-me que os meus filhos não pediram uma única vez para ir para a escola. E, reparem, eu tenho a certeza absoluta que a escola é óptima e tem sido absolutamente vital para os miúdos adquirirem alguns hábitos necessários. Não me arrependo nada de ter escolhido a escola que escolhi! Mas não falaram da escola nem uma única vez. Nem quando perguntava se tinham saudades dos colegas. Isto leva-me a pensar numa coisa muito simples: embora a socialização da criança seja importante após os 2/ 3 anos de idade, a verdade é que o universo natural da criança é a família. E tomei a plena consciência disso.

Se a família estiver bem, não há confinamento que belisque os miúdos.

Também aprendi que a nossa casa é o nosso santuário. E percebi que temos que escolher criteriosamente os objectos que nos rodeiam. Não, não estou armada em Marie Kondo, a despachar sacos de objectos para  lixo/reciclagem/reutilização. Mas percebi a importância do nosso espaço. Eu passo tantas horas fora de casa que quase me esqueci que a casa é primariamente uma toca. E nós somos mamíferos. Se não cultivar coisas que gosto no meu espaço, como posso encarar o espaço adverso, público, de todos?

Por fim, (re)descobri o poder curativo do duche. Numa fase em que as deslocações estavam limitadas a casa e trabalho, o duche passou a ser o momento de evasão. Se calhar é o mais próximo de estar à chuva sem tecto sobre a cabeça. Se calhar é o mais próximo que consegui ter da submersão no mar. Mas o duche foi o momento mais importante do dia. Mesmo no trabalho, com os múltiplos duches que preciso de tomar entre equipar e desequipar o material de protecção, o banho é o oásis de calma, o compasso de silencio no meio do furacão.

E vocês? O que (des)aprenderam com o confinamento?

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